Novo governo deseja voltar uso de Data Center

Em discurso feito por integrantes do novo governo que esta em transição surtiu uma luz no fim do túnel para evitar o monopólio das Big tech também no Brasil em uso de sua infra, geração de renda para seu país de origem apenas.

Antes de entrarmos no texto, a Europa debate muito a dependência das grandes empresas dos EUA em nuvem, sempre focando em ter soluções nacional/regional e menos dependência deles. Já que dependemos da sua tecnologia, disponibilidade e a maior parte do capital vai embora. Não ajudando na geração de riqueza no país…

A adoção de estrutura de nuvem pública no governo foi longe demais e é hora de voltar a construir data centers próprios.

A tese, que deve causar arrepios nos grandes fornecedores de nuvem pública e júbilo em fornecedores de hardware, foi exposta de maneira quase casual por César Alvarez, um dos integrantes da transição do governo Lula, nesta sexta-feira, 25.

“Nesse tema, outra questão é a irresponsabilidade com a transferência dos dados das universidades, dos órgãos públicos. Está tudo na nuvem dos grandes. Vamos ter que voltar a ter uma política de data centers”, disparou Alvarez, durante coletiva com jornalistas em Brasília.

O comentário foi um entre muitos durante uma conversa que abordou projetos de inclusão digital, regulamentação de grandes redes sociais e outros temas.

Quase 300 pessoas foram nomeadas para os grupos de transição do novo governo, mas Alvarez não é exatamente um desconhecido.

Ele é um quadro técnico de longa data do PT, tendo sido coordenador de programas de inclusão digital durante o Governo Lula e secretário-executivo do Ministério das Comunicações e também do Ministério da Educação no Governo Dilma.

A estratégia de nuvem não é exatamente uma criação do governo Bolsonaro (PL), que nesse campo só deu continuidade a uma mudança de orientação cujas raízes podem ser encontradas no governo Dilma Rousseff (PT), quase uma década atrás.

A reversão de rumos proposta por Alvarez é muito mais complexa do que parece. Ainda durante a gestão Dilma a administração federal começou a se afastar da linha clássica da estratégia de tecnologia dos governos petistas de apostar em soluções open source desenvolvidas internamente, voltando a fechar grandes compras de software proprietário.

Nos anos de Michel Temer (PMDB), a virada de rumos foi aprofundada com os primeiros grandes passos para grandes compras conjuntas de nuvem pública.

Em 2018, a primeira licitação do tipo foi vencida pela Embratel com a nuvem da AWS, com um valor inicial de R$ 30 milhões para 10 órgãos. Com 13 adesões posteriores, o valor chegou a R$ 55 milhões.

Em abril de 2021, já no governo Bolsonaro, foi feita uma nova compra, no valor de R$ 65,94 milhões, em um pacote com nuvens da AWS, Huawei e Google. Ao todo, 44 órgãos públicos mostraram interesse.

O desconto oferecido foi significativo, uma vez que a licitação chegou a ser estimada inicialmente em R$ 340 milhões.

Além das compras organizadas pelo Ministério do Planejamento (da Economia, no governo Bolsonaro), a orientação mais aberta em relação a computação em nuvem abriu um nicho para empresas estatais de TI se tornarem intermediários nas compras, papel conhecido como “cloud broker”.

Quem está na frente nesse assunto é o Serpro, a maior estatal de tecnologia do país, que já fechou acordos para intermediar a adoção de todas as grandes nuvens, com exceção até o momento do Google Cloud.

As condições são sempre as mesmas: contratos de cinco anos, nos quais os valores fechados são apenas uma base, cuja concretização vai depender de quanto o Serpro vai efetivamente vender no final.

Todos os acordos são diretos, sem licitação, com base em uma dispensa prevista na Lei de Estatais. O valor até o momento chega a R$ 177,7 milhões.

A AWS foi a primeira a entrar, com um contrato de R$ 71,2 milhões ainda em 2019. Depois vieram Huawei (R$ 23 milhões), Microsoft (R$ 22,6 milhões), Oracle (R$ 41,5 milhões) e IBM (R$ 40,3 milhões).

A tendência já se espalhou também nos governos estaduais. Em setembro, empresas estaduais de tecnologia adotaram o mesmo princípio de compra no atacado, colocando a estatal gaúcha Procergs como broker para um grupo de 11 estatais, 10 estaduais e uma municipal.

A licitação ficou em um valor total de R$ 224,98 milhões, envolvendo a compra de nuvens Oracle, Huawei Cloud e AWS.

A grande pergunta é o quanto o novo governo conseguiria reverter a adoção das grandes nuvens públicas de AWS, Microsoft, Google Cloud e outros players multinacionais maiores, mesmo que queira fazer isso.

Os contratos fechados até agora são de longo prazo, as estruturas físicas legadas provavelmente já não comportam toda a demanda de processamento, exigindo investimentos extras. Empresas públicas como o Serpro têm uma fonte de renda nova.

Alvarez falou em “irresponsabilidade”, mas não chegou a detalhar em relação a quê.

Por muito tempo, o principal argumento contra a adoção de nuvens públicas pelo governo era a armazenagem de dados fora das fronteiras do Brasil, sob a jurisdição de outros países.

Acontece que, no meio tempo, as gigantes de tecnologia também fizeram seu dever de casa. Hoje, todas têm centros de dados no Brasil, muitas delas inclusive com dois, com o segundo servindo de backup para o primeiro.

Outra linha de argumentação é a conveniência de concentrar tantos serviços em relativamente poucos fornecedores.

No final de 2021, uma série de órgãos de governo, incluindo o Ministério da Saúde, a Controladoria Geral da União e a Polícia Rodoviária Federal, ficaram fora do ar, por um ataque à infraestrutura comum de nuvem deles, hospedada na AWS, cuja contratação foi intermediada pela Embratel.

Na época, a Embratel afirmou que cada órgão é responsável pela administração do ambiente de nuvem, e que atua apenas como “broker de Infraestrutura como Serviço”. Ainda de acordo com a Embratel, “o edital e a ata de registro de preços não incluíram serviços de segurança de dados de nossa empresa”.

Defensores de uma maior adoção de nuvem pública no governo com certeza dirão que crises desse tipo podem ser evitadas com uma maior maturidade nas políticas de segurança da informação, sem as quais uma infraestrutura on premise também não é segura.

Uma outra linha de argumentação em prol de reduzir o uso de grandes nuvens públicas seria o papel estratégico das compras públicas no fomento da política industrial do governo para o desenvolvimento do setor de tecnologia nacional.

É o tipo de tese que andava meio sumida nos últimos anos, mas sempre foi cara a petistas mais ortodoxos.

(Em relação a data centers especificamente, um velho sonho era criar uma zona especial nas proximidades de Itaipú, aproveitando a energia barata pela proximidade da hidrelétrica. Talvez só esse repórter lembre disso hoje em dia).

Em que pese as infraestruturas instaladas no país (muitas construídas por grandes players de data centers com capital brasileiro) e o dinheiro faturado pelos diferentes “brokers”, a nova estratégia de nuvem concentra o investimento em poucos players.

Os contratos são faturados na ponta por meia dúzia de multinacionais, com a fatia do leão indo para a AWS, como já acontece no setor privado.

É uma movimentação vista com desaprovação pelas empresas nacionais de tecnologia, o público alvo de estratégias de política industrial clássicas.

A Assespro, entidade que representa 2,5 mil empresas brasileiras de tecnologia, a maioria delas médias e pequenas, chegou a enviar um ofício ao governo federal questionando a decisão de negociar descontos com os maiores fornecedores de tecnologia da administração pública.

Na sua nota, a Assespro afirma que acredita que as compras públicas são “um fator indutor do processo de crescimento econômico e de geração de emprego e renda” e que o sistema de compras concentradas “reduz a saudável variedade de oferta de soluções, especialmente em um segmento tecnológico e estratégico”.

Fonte: Baguete